20/06 | 2 anos de Coletivamente

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Introdução
A recusa alimentar é uma atitude típica da primeira infância, caracterizada por
comportamentos como: fazer birras, demorar a comer, tentar negociar o alimento que será
consumido, levantar da mesa durante a refeição e beliscar ao longo do dia. No entanto,
parece haver crianças que persistem com comportamentos peculiares até meados da
infância ou continuam pelas demais fases da vida. Esses comportamentos seriam
definidos como seletividade alimentar (SA), que é caracterizada por um consumo alimentar
altamente limitado e extrema resistência em experimentar novos alimentos. Esse tipo de
comportamento resulta em uma limitação das atividades sociais relacionadas à
alimentação.

De acordo com os sistemas de classificação DSM-IV (Sistema de Diagnóstico e Estatístico
de Classificação de Doenças Mentais) e CID 10 (Classificação Estatística Internacional de
Doenças), a SA não está descrita como um diagnóstico específico de transtorno alimentar
na infância, mas ambos a associam a uma dificuldade persistente em comer
adequadamente, com falha no ganho de peso ou importante perda ponderal durante o
último mês. Não existem condições fisiopatológicas ou desordens mentais associadas, não
há falta de acesso aos alimentos e o distúrbio deve ter início antes dos 6 anos 2 .

Os dados de prevalência de SA são escassos, mas vêm sendo caracterizados nas
percepções e relatos de pais e professores. Segundo eles, a seletividade seria mais
comum em crianças de 10 a 24 meses (19% a 50% dos casos). A imprecisão sobre a
definição exata da SA, assim como a variabilidade de critérios metodológicos utilizados
nos estudos, dificulta a determinação da prevalência. Não há evidências que relacionem o
quadro de SA com comportamentos característicos de transtornos alimentares, como:
fazer dieta, episódios de compulsões alimentares e controle obsessivo do peso corporal. A
ausência de dados consistentes de prevalência, definição do distúrbio e de suas
características, principalmente em termos das escolhas alimentares, justifica a descrição
do relato de caso de seletividade alimentar, fornecendo informações que podem auxiliar
profissionais da área da saúde e da educação na identificação e no tratamento do
distúrbio.

De acordo com a literatura, a amamentação poderia facilitar a aceitação de novos
alimentos, visto que as características sensoriais do leite materno são influenciadas pela
dieta da mãe e permite o primeiro contato da criança com sabores e odores variados. Esse
contato possibilitaria a melhora da aceitação de novos alimentos quando oferecidos
inicialmente. O curto período de aleitamento materno pode impossibilitar essa experiência,
e uma vez alimentado com leite de fórmula, o bebê acaba só tendo conhecimento do
paladar do leite de vaca, o que não é o melhor prognostico.

Crianças que apresentam atraso na introdução de alimentos sólidos durante o primeiro
ano de vida estão mais propensas a desenvolver comportamentos seletivos ao longo da
infância, sendo estes mais claramente identificados ao redor dos 3-4 anos de idade.
A maneira de oferecer alimentos também pode ser variada, como alternar entre dar
comida na boca ou deixar comer sozinho, o que chamamos de método participativo.

O quadro clínico da SA está normalmente associado ao consumo de alimentos de uma
tonalidade (como branco) e de sabor muito suave (como leite, pão, macarrão etc.,
alimentos com características pré-inflamatórias) ou determinada textura (pastoso ou
crocante), com recusa de preparações com alimentos de texturas variadas. Em certos
casos é possível observar preferência por determinadas marcas de alimentos ou mesmo a
temperatura em que são servidos (frios ou quentes). Além disso, algumas crianças não toleram o odor de alimentos que não fazem parte de sua restrita lista de preferências,
prejudicando seu convívio com familiares e amigos no momento das refeições.

Família e professores fundamentais
De acordo com a literatura, algumas crianças mostram-se ansiosas diante de alimentos
com molho ou que são fáceis para se sujar, comportamento que pode estar associado a
mães obsessivas por limpeza ou que não permitiram ao filho usar as mãos para alimentar-
se.

A família e os professores são fundamentais para a formação e a estruturação dos hábitos
e condutas alimentares das crianças. Também são responsáveis por promover o ambiente
das primeiras experiências alimentares que podem ser decisivas para a aceitação de
novos alimentos. Se um ambiente é agradável e novos alimentos são oferecidos sem
coação, a criança fica muito mais suscetível a desenvolver preferência por eles.
Sabe-se que a desestruturação familiar pode influenciar a SA em algumas crianças, sendo
importante a conscientização do problema vivenciado, de forma a impor limites sem,
contudo, perder o controle. É importante ressaltar a recomendação de que os pais devem
ponderar suas atitudes e ambos devem participar ativamente no processo de educação
alimentar.
.
Em alguns casos, quando a criança não supre as expectativas dos pais com relação ao
consumo alimentar, o descontrole emocional que se instala coloca a criança no controle da
situação, permitindo que ela mesma decida o que comer, destituindo os seus
responsáveis. É importante ressaltar que crianças seletivas normalmente apresentam
comportamentos fóbicos diante de alimentos que não são de sua preferência, gerando
confrontos e atitudes agressivas para evitar comer o que não querem.

A ansiedade dos familiares para ver a criança comer levaria à substituição de alimentos
saudáveis por aqueles de baixo valor nutritivo, os quais normalmente fazem parte das
preferências dos seletivos. Dados demonstram que 45% dos pais gostariam de mudar os
hábitos das crianças; para isso, 51% oferecem recompensas e 69% persuadem seus
filhos.

O prejuízo social parece ser uma característica comum no cotidiano dos indivíduos
identificados com SA, especialmente quando a lista de alimentos aceitáveis é muito
restrita. A criança pode sentir-se intimidada pelos demais e, à medida que vai crescendo,
seu constrangimento sobre sua forma de alimentar-se a torna muito reservada.

Conclusão
A fim de minimizar as consequências da má alimentação promovida pela seletividade e
tornar a criança mais receptivas para as terapias auxiliares, é importante a participação
ativa dos pais e professores na identificação dos sinais e sintomas característicos da SA.
O tratamento precoce evita as consequências de carências nutricionais e possibilita o
crescimento e o desenvolvimento adequado, garantindo assim, um melhor prognóstico,
principalmente se considerarmos indivíduos com TEA.

Carolina Liberato

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