Compor uma família é o sonho de milhões de brasileiros. Para milhares de crianças, essa alegria é um anseio distante ou talvez uma falta ainda não preenchida. Dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA) apontam que, em todo o país, aproximadamente 5.063 crianças e adolescentes esperam por um lar. Muitos acabam permanecendo mais tempo em abrigos devido a estarem perto da adolescência, ou até por serem portadores de deficiências ou condições especiais.
O casal Rodrigo Neitzl e Everton Oliveira, juntos há oito anos, não enxergaram nada além de amor quando adotaram os gêmeos de espectro autista Gustavo e Guilherme. Os meninos atualmente têm 9 anos. Rodrigo, que é jornalista, contou que os filhos transformaram a realidade dele e do esposo, e que o sentimento de ser pai ultrapassa qualquer barreira.
“Eles mudaram nossa vida, trouxeram cor aos nossos dias e transformaram nossa realidade. Se fossemos seguir as normas sociais, teríamos um filho de barriga solidária, mas o sentimento de ser pai ultrapassa isso. Escolhemos dar amor”, contou.
A decisão da adoção foi feita pelo casal uma semana após Rodrigo e Everton se casarem, em março de 2023. Para cuidar melhor dos filhos, o casal precisou se reorganizar. Everton tirou licença do trabalho e Rodrigo trocou de empresa para trabalhar via home office. Mas o jornalista afirma que amor dos filhos faz tudo valer a pena.
“Vivemos um dia de cada vez, nos adaptamos, temos uma rotina louca de terapias, tratamentos, consultas, e passamos por desafios que hoje nos fortaleceram. Hoje o Gustavo fala melhor, e o Guilherme pronuncia pequenas sílabas, pois ele é não-verbal. Eles sorriem, nos abraçam, amam, são crianças mudadas e que nos mostram que o amor é muito mais do que só uma palavra”, conta
Projeto incentivador
Em 2017, a Corregedoria Geral de Justiça do Espírito Santo, deu início ao projeto “Esperando por você”, para estimular a adoção de 26 crianças atípicas e com deficiência, grupos de irmãos e adolescentes em todo o Espírito Santo.
A juíza Lorena Miranda Laranja do Amaral, da Primeira Vara da Infância e Juventude de Vitória, conta que o projeto foi feito porque a maioria das pessoas querem um perfil específico para adoção, deixando muitas crianças aguardando o sonho de ter uma família.
A juíza destaca que as fotos e vídeos das crianças e adolescentes que participam do projeto são realizadas de forma excepcional através da Corregedoria, com a manifestação da vontade de adoção, e para defender os interesses dos participantes.
“O adolescente tem que querer ser adotado. Nós fazemos uma filmagem através da Corregedoria, e subimos para o site do projeto. As fotos das crianças e adolescentes são divulgadas de forma excepcional, para defender os interesses das crianças”, pontua.
Os pretendentes com interesse em adotar através da campanha deverão entrar no site do projeto, e preencher um formulário que consta logo abaixo da foto da criança escolhida. O documento será automaticamente enviado para a Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja-ES).
Após o cadastro, os pretendentes receberão uma resposta via e-mail, e a situação de habilitação será avaliada pelo Ceja. A comissão entrará em contato com os pretendentes habilitados via telefone, obedecendo a ordem da data do preenchimento do cadastro.
As principais características das crianças são apresentadas aos pretendentes, que terão o prazo de 48 horas para se manifestarem. Caso a resposta seja positiva, a Ceja informa a Vara de Justiça do respectivo município onde os pretendentes moram sobre o interesse manifestado.
Rodrigo conta que, após passar pelo processo de habilitação junto do esposo, o sistema do SNA conectou a ficha aos gêmeos. Após dois meses conhecendo os meninos e noites sem dormir, os Guilherme e Gustavo tornaram-se oficialmente filhos de Rodrigo e Everton.
“Depois de recebermos a notícia, ficamos um final de semana sem dormir. Ficamos outubro e novembro os visitando, e em primeiro de dezembro de 2023 ele oficialmente vieram morar conosco. Montamos um quarto, fizemos a pintura a mobília e compramos brinquedos, tudo para receber eles da forma mais adequada possível”, contou.
Dentre as etapas da habilitação, estão curso de habilitação, entrevista com psicólogo, envio de documentos, e até visita domiciliar de equipe responsável, explica a juíza Lorena.
“Os candidatos precisam fazer um curso de habilitação, passar por entrevista com psicólogo e assistente social, além de passar por um curso específico e, por vezes, receber visita domiciliar da equipe responsável. Também é necessário enviar documentos para a respectiva vara de justiça, como comprovantes de rendimentos, comprovante de saúde mental e física, cópias do CPF, RG, dentre outros“, explicou.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê que o processo de adoção deve ser iniciado com buscas de candidatos habilitados no município onde a criança mora, dentro do sistema nacional de adoção gerido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Caso nenhum candidato habilitado e disposto a adotar a criança com as características apresentadas seja encontrado, a procura segue em cadência nos níveis estadual, nacional e internacional.
FONTE: https://www.folhavitoria.com.br/geral/noticia/01/2025/casal-homoafetivo-adota-gemeos-com-autismo-mudaram-nossas-vidas