Com Francilene Vaz (pedagoga)
“Seja menos curioso sobre as pessoas e mais curioso sobre ideias” (Marie Curie)
A dupla excepcionalidade em mulheres ainda é um assunto pouco abordado. O índice de mulheres subdiagnosticadas é altíssimo. A falta de reconhecimento das mulheres acerca do próprio diagnóstico é prejudicial, pois nos deixa à parte nas políticas públicas e nos atendimentos educacionais, médicos e sociais.
O próprio MEC cita que os números de meninas AH/SD matriculadas nas escolas são em torno de 38%, o que é um número baixo, já que há igualdade entre os gêneros para o nascimento de pessoas superdotadas.
A não aceitabilidade da própria condição de superdotada inviabiliza a manifestação das próprias emoções, inteligência, aptidões. A falta de oportunidades de uma vida inteira sem diagnóstico faz com que muitas delas não se aceitem com a inteligência acima da média e atribuam a demonstração da sua própria condição às consequências psicológicas e transtornos associados.
O mascaramento tão citado no autismo também é visto na superdotação. As mulheres, muitas vezes, escondem suas habilidades para serem mais bem aceitas em seus meios.
Profissionais mal preparados
Profissionais despreparados atribuem às comorbidades associadas às características que as definem como mulheres superdotadas. E a sensibilidade, hiper empatia, habilidades em artes, músicas nem chegam a ser cogitadas como indicadores e critérios para a superdotação.
Ainda temos profissionais que resistem em proporcionar atendimentos diferenciados e em proporem projetos cuja demanda não seja masculina. Julgam serem desnecessários e meritocráticos. Enquanto nós pensamos, sim, que deveria haver atendimentos diferenciados, pois somos realmente diferentes dos superdotados masculinos.
Esse atendimento diferenciado deve partir inclusive da própria avaliação. Os termos apropriados ao universo feminino precisam ser repensados. Já perceberam que o termo gênio, de acordo com as normas da língua portuguesa, só existe no gênero masculino?
Cabe a reflexão!
E se pedirmos a uma plateia que cite gênios da humanidade, certamente ouviremos Einstein, Beethoven, Van Gogh, Santos Dumont…. Mas onde estão as mulheres gênios?
Esse sentimento de alienação acerca de quem somos nos priva de mudar o nosso entorno ou até mesmo de solucionar situações, que, com o autoconhecimento, podemos alcançar. Falamos muito de diagnóstico precoce em várias situações, condições e transtornos do neurodesenvolvimento. Mas e o direito e acesso ao diagnóstico tardio para os superdotados?
Procura por ajuda
O pertencimento de quem somos está diretamente relacionado ao reconhecimento em sermos superdotadas. Não por nos sentirmos melhores, e sim por desejarmos ser exatamente quem somos.
Portanto, é importante lermos mais, encontrarmos outras mulheres com características semelhantes às nossas. E, ao primeiro sinal de alerta, procurarmos ajuda. Um diagnóstico de superdotação pode revolucionar uma trajetória. Muito mais que isso, pode proporcionar às próximas gerações condições mais saudáveis e propícias, principalmente no ambiente escolar, onde geralmente os traços de superdotação são observados primeiro. E vale ressaltar que a superdotação é genética, uma vez que, enquanto adulto, obtém-se o diagnóstico, a atenção deve ser redobrada aos filhos.
“Eu mesma precisei de incentivos e motivações extras para buscar meu diagnóstico. Foi através do perfil sobre autismo feminino e superdotação da Cláudia Moraes que comecei a me reconhecer como mulher superdotada. Ela trazia respostas de situações que eu experienciei no decorrer da minha vida. Até que chegou o momento da autoaceitação, e eu percebi que todos aqueles textos descreviam minha trajetória até aqui. Ter o mesmo diagnóstico nos uniu em irmandade”. (Francilene Vaz)
A falta de um diagnóstico correto anula quem somos. Impossibilita a multiforme conscienciosidade de sermos superdotadas. Para a construção de uma identidade feminina na superdotação, é necessário, pela sociedade, o reconhecimento e a aceitação além das diferenças de gênero, valorizando-se princípios, atitudes, potencial criativo, entre outros apresentados diferentemente pelas mulheres.
Onde ficam na história as mulheres com genialidade?