Em relação ao TEA (transtorno do espectro autista) muito se tem falado no país sobre o diagnóstico precoce, a inclusão escolar, as terapêuticas e metodologias que envolvem crianças. Falar sobre adultos é muito esporádico, falar de mulheres adultas mais esporádico ainda.
Até nas práticas baseadas em evidências se fala pouco sobre mulheres, e é natural pensarmos que pouca prevenção para a saúde mental desse público tem sido feita, ignorando-se fatores importantes como a alta taxa de suicídio, e condições associadas como ansiedade, depressão, automutilação, fibromialgia, entre outras.
Segundo o estudo (Morte por Suicídio entre Pessoas com Autismo: Para além do Zebrafish*) as taxas de suicídio em moças e mulheres (que tenham outros diagnósticos psiquiátricos, como ansiedade e transtornos do humor) são devastadoramente maiores do que em rapazes e homens.
Expectativa social
Alguns fatores são apontados como risco para saúde mental das autistas, o que me leva a refletir: com a dificuldade dos profissionais para diagnosticar mulheres, e que ainda apresentem outros transtornos, pode-se ver como resultado os riscos serem desapercebidos ocasionando maus diagnósticos, falta de intervenções ou até mesmo não-diagnósticos.
A expectativa social que se cria para que as autistas mascarem estereotipias e stimming (stimming ou stim são movimentos corporais repetitivos que auto-estimulam um mais sentidos, de maneira regulada) agindo assim como se fossem típicos, é o maior fator de risco para a saúde mental dessas mulheres, pois isso gera ansiedade e diminuição de auto-estima. Desrespeita-se assim um dos principais déficits do autismo que é de interação social e também as individualidades dos sujeitos.
A parte feminina do autismo é mais afetada por condições como Ansiedade, Depressão e Transtornos Alimentares, além de maior propensão a demonstrarem sofrimento psicológico, e isso também relacionado ao diagnóstico tardio, onde se observam através de critérios diagnósticos mais claramente os sintomas apresentados pela parte masculina, o que dificulta as meninas serem diagnosticadas mais precocemente.
Outro fator importante a ser observado é que quanto mais tardio o diagnóstico, maiores são as propensões apresentadas para o suicídio. Se no Brasil ainda não falamos de autismo em mulheres adultas, o que sabemos do autismo em mulheres idosas?
Desenvolvimento do Masking
Mulheres autistas desenvolvem algo que é chamado Masking (mascaramento ou camuflagem) devido a receberem maior pressão de familiares e entorno para que sejam mais hábeis nas interações sociais. Então, para que consigam lidar com as pressões e tentar serem aceitas, elas mascaram os sintomas do autismo o que ao longo do tempo se torna uma bomba pronta a explodir, cujo resultado é o aparecimento e agravamento de processos dolorosos mentais e físicos como fibromialgia, depressão, mutilações…
Não só no caso de profissionais de saúde, mas daqueles que convivem com autistas, é bom observarem comportamentos que podem indicar pensamentos suicidas, não negar o que diz a pessoa, demonstrar empatia, e levar a sério qualquer relato desse tipo.
Também dentro da saúde mental das mulheres autistas, quero salientar que tanto a família, amigos, colegas de trabalho esperam que elas se adaptem e não o contrário, aumentando a pressão já vivida e as expectativas que se espera de que acertem sempre.
Adaptações deveriam vir de forma empática, e não esperar que apenas a pessoa autista dê conta de tudo o que se espera dela, sem que isso lhe cause maiores sofrimentos.
A inclusão é muito citada em belos discursos, mas no geral não se dá conta que para que ele se torne real é preciso flexibilização e adaptações “com” e “para” as pessoas autistas. Que os neurotípicos inseridos nesse processo não se eximam de suas responsabilidades com a desculpa que o autismo delas é “levinho”.
Se você convive com uma mulher autista, recorde-se do que foi dito acima e utilize-se de maior sensibilidade com quem nos estudos se mostra o público mais afetado e vulnerável.
REFERÊNCIA:
Death by Suicide Among People With Autism: Beyond Zebrafish
Mikle South, PhD1; Andreia P. Costa, PhD2; Carly McMorris, PhD3
Author Affiliations Article Information
JAMA Netw Open. 2021;4(1):e2034018. doi:10.1001/jamanetworkopen.2020.34018
Online: https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2774853
*Zebrafish: modelo consagrado para estudos de doenças humanas