20/06 | 2 anos de Coletivamente

Compartilhe

Superdotação e intensidade

Compartilhe

A maior parte das pessoas tem ideias estereotipadas sobre o autismo, e ainda mais sobre a superdotação. O mito que autistas são alheados do mundo, que não têm sentimentos, é cruel. Autistas sentem, sim, só que a forma e o tempo de resposta varia para cada um.

Ontem li um texto em que a pessoa autista se dizia pouco reativa aos próprios sentimentos, e precisa de mais tempo para interiorizá-lo e depois externá-lo. Esse direito a lidar de maneira saudável com os próprios sentimentos deveria ser respeitado. O direito a não responder imediatamente também. Não forcem respostas, a insistência e a repetição de perguntas é irritante. À vezes, para satisfazer o interlocutor, o autista responde qualquer coisa, então nem é o que sente e pode não fazer qualquer sentido.

Uma expressão muito usada no autismo é: “você não tem filtro”. E acredito que isso se dê pela falta de tempo para a resposta, então o autista fala qualquer coisa, aí a outra pessoa se ofende.

Já na superdotação, os sentimentos são muito intensos e externados com fala e expressões quase imediatas, então os “tá fazendo drama” ou “tá de mimimi” que nos dizem, nos atingem tão intensamente que isso pode nos adoecer. A tristeza dói muito, por pessoas que não têm ideia de como nos atingiram.

Viver a Dupla Excepcionalidade é tentar o tempo todo equilibrar os sintomas de um e de outro, e a luta interna é grande. Outro dia me peguei numa batalha homérica entre meu cérebro e a minha boca. A boca queria que eu desse uma resposta, mas meu cérebro entendia que era inadequada. Aí uma das pessoas que viu a cena achou que eu “perdi o rebolado”, e na verdade era a luta entre o cérebro e a boca, e a espera para saber quem seria o vencedor. O cérebro venceu, dessa vez. Uma das coisas que fazem o Autismo Nivel 1 não ser leve é cobrir de respostas os nossos sentimentos, que o outro não entende ou é capaz de entender nas suas manifestações.

Ajustes emocionais

O sentir e a administração desses sentimentos é algo complicado para qualquer ser humano. Uma vez li que somos a soma de nossos traumas, aí enorme gama de sentimentos já se instala. Os traumas nos deixam cargas intensas e negativas, que na maioria das vezes temos dificuldades em superar, e só os escondemos em gavetas. Se você que me lê tiver oportunidade, assista ao lindo filme “O Príncipe das marés”, com Barbra Streisand e Nick Nolte. O autismo é um transtorno que muitas vezes lhe deixa vulnerável justamente porque você não sabe direito lidar com a intensidade, com a definição do que você sente e ainda com a necessidade de adequar cada um desses sentimentos segundo regras sociais que você nem sempre entende.

Na superdotação, por vezes você é dominado por uma “cabeça d’água” de sentimentos, eles te invadem rapidamente, você se afoga e muitas vezes não dá tempo de pedir socorro ou se agarrar em alguma coisa, fica completamente exposta, sem reação, deixando-se apenas afogar, ou de forma potencialmente inversa, você luta tanto contra o afogamento que o pânico te faz machucar até quem tenta te salvar.

Ajustar as emoções sendo humana, autista e superdotada é por tantas vezes cansativo, e com resultados desastrosos. Mas tudo na vida tem compensações, quando você encontra quem entende suas tempestades, e as atravessa junto contigo, dividindo um guarda-chuvas… Qualquer intempérie se torna perfeita! Nessa hora, ficam em nossas vidas aquelas pessoas que tem maior sensibilidade, nos dão tempo/espaço para as respostas, e procuram nos entender.

Veja também...

No vídeo abaixo, bem humorado, toco em pontos que comumente as pessoas confundem quando tratamos de autismo. Espero que gostem.

Mãe, pai… Você não precisa dar conta de tudo.Nem ser perfeito.Nem acertar sempre. Ser pai ou mãe já é, por si só, …

Você já conhecia o Experimento de Milgram? Nos anos 1960, o psicólogo Stanley Milgram realizou um dos experimentos mais marcantes da história …

plugins premium WordPress