A Simpatia da Juventude aliou a tradição caipira à inclusão. A aposta em falar sobre o transtorno do espectro autista (TEA) rendeu para a quadrilha a conquista dos três festivais realizados no Arraiá do Povo: 6º Festival Municipal Sandro Rogério, 7º Forrozão do Primo Sebastian e 16º Arraiá no Meio do Mundo, no estado do Amapá.
Os brincantes se preparam para representar o Amapá no campeonato nacional, realizado em Alagoas, nos dias 26 e 27 de julho. O Arraiá do Povo encerrou na última semana. Passaram pela cidade junina mais de 60 grupos. As competições foram divididas por noites.
A liga Arraiá no Meio do Mundo, responsável pelo último festival, divulgou que na categoria estilizados três grupos empataram em primeiro lugar, são eles: Simpatia da Juventude, Estrela do Norte e Luar do Sertão.
O tradicional grupo do bairro do Laguinho destacou a importância da inclusão e do respeito às pessoas com TEA. A aposta considerada ousada por parte da presidência veio representada nas cores, na canção junina e nos passos.
Em um dos cartazes expostos durante a apresentação, a Simpa – como a quadrilha é carinhosamente chamada – trouxe a frase: “com amor, as peças se encaixam”, numa alusão a um quebra-cabeça.
O simbolismo relembra a ideia de que crianças com autismo não se encaixavam na sociedade, como uma verdadeira peça solta do jogo.
Entre o compasso da dança e o ritmo da sanfona, a Simpatia mostrou que sensibilidade ao falar do tema faz com que esse quebra-cabeça seja montado.
O presidente Pedro Ivo Guto destacou que o grupo contou com a ajuda de especialistas para construir o tema apresentado. Guto considera que a ousadia foi a cereja para consagração da Simpa.
“Desde o primeiro momento a gente se assustou, mas o tema era uma palavra: autismo. Depois veio o mundo azul, e a ideia foi se encaixando ao longo do tempo. Em uma espécie de laboratório, a gente conseguiu trazer pessoas especializadas no tema, então começamos abrir a mente e perceber que tem gestos, jeitos, sinais, modos e daí trouxemos para a quadra junina e isso que está encantando todo mundo”, disse.
Miss caipira
A miss caipira Joana Ramos foi eleita a melhor do festival do Forrozão do Primo Sebastian pelo segundo ano consecutivo. Ela está à frente da Simpatia da Juventude há quatro anos. Em 2025, ela descreve a quadra junina como: desafiadora.
“Minha história com a quadrilha vem da minha família que sempre fez parte dos movimentos juninos, por ser uma família com grande legado dentro do bairro do laguinho. Então a quadrilha significa muito para mim, não somente por ser o lugar onde iniciei dançando, mas também por ter aprendido muito. Ser miss caipira não é uma tarefa fácil e simples, requer muita dedicação, empenho e força de vontade”, disse.
Joana destaca que falar de TEA na quadra junina é um dos caminhos para combater a desinformação.
“Trazer o autismo para a quadra junina vai muito além de só falar de um tema de grande relevância dentro da nossa sociedade, mas também parte muito do pressuposto de que é fundamental falar de autismo tanto na educação quanto como na forma de inclusão social, tendo também respeito à diversidade humana, porque falar de autismo ajuda a combater o preconceito, o capacitismo e a desinformação. Quando a gente entende o que é o TEA, o que é esse transtorno no espectro autista, a gente passa a respeitar melhor essas diferenças de comportamento, de comunicação e a aprendizagem das pessoas autistas”.
O tema ganha ainda mais destaque quando analisados dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): o Amapá é o segundo estado com o maior número de diagnósticos de autismo no país, com 11 mil pessoas.
Os números apontam que os 11 mil registrados consistem em 1,5% da população do estado, que é de 733,7 mil. Sendo 7,2 mil (2%) homens e 3,8 mil (1,1%) mulheres. A quantidade é a segunda maior do país, ficando atrás somente do estado do Acre, que tem 1,6%.
Atos da Fera
Como característica da quadra junina estão os “atos” durante a apresentação, que consistem na representação de cenas relacionadas à temática escolhida. A indumentária da Simpa também fez parte desses atos. Os brincantes vieram vestidos com roupas nas cores azuis e rosa, além de usarem uma espécie de fone abafador. Sendo o azul, a principal representação de pessoas com TEA.
Em uma das cenas, um dançarino representou uma pessoa com TEA tendo uma crise. Com as mãos na altura dos ouvidos, o dançarino demonstrava incômodo com o barulho e, para se “acalmar” contou com o acolhimento da parceira de dança.
Casamento na roça
O tradicional casamento na roça dessa vez ganhou novos personagens. O noivo foi diagnosticado com autismo de suporte nível um. Durante o pedido de casamento, veio o questionamento por parte do pai da noiva: por que o jovem tinha tantas “manias”?
A encenação continua e mostra a explicação do noivo sobre sua condição enquanto portador de TEA. Essa foi uma forma que a Simpa encontrou de explicar de maneira dinâmica a convivência com alguém com autismo.
O campeonato reúne as campeãs de todo o país durante dois dias de disputa. O evento é organizado pela Confederação Nacional de Quadrilhas Juninas e ocorre nos dias 26 e 27 de julho.
FONTE: https://g1.globo.com/ap/amapa/noticia/2025/07/07/autismo-e-quadra-junina-entenda-como-a-inclusao-fez-o-grupo-junino-do-amapa-ganhar-tres-festivais.ghtml